Comemorar o Natal, antes e depois
* Por Ana Rute Cavaco
Este texto faz parte da série de Advento 2020
Luzes, montar o pinheiro de Natal com o presépio em baixo, ensaios para peças de teatro, festa na escola, festa na igreja, avós, tios, comida a fumegar, prendas. Ah, as prendas tão desejadas. O jantar comido a imaginar o conteúdo das embalagens maiores, deitar tarde, e acordar no dia 25, retirar as etiquetas da roupa nova acabada de receber, ir ao culto na Igreja, regressar a casa, colocar as sobras do bacalhau e legumes ao lume, comer “roupa velha”* e ver filmes. É assim que recordo o Natal da minha infância. Um Natal em que se fazia por conciliar o nascimento do nosso Senhor com as tradições da nossa cultura.
Hoje, o desafio permanece. O meu Natal mudou há dezoito anos, quando casei. Foi preciso ajustar encontros, famílias maternas e paternas, tradições, convicções. Comemorar o Natal é, muitas vezes, estar com quem não acredita no mesmo que nós, e passa também por respeitar esse lugar, não abdicando do que para nós é também importante.
O que ficou da minha infância? Ficaram as luzes, o pinheiro, algumas festas, diferentes comidas e a ida ao que – para mim, hoje – é o ponto alto do Natal: o louvor em Igreja na manhã de dia 25.
Com esta nova fase de vida, e à medida que uma família cresce e tem filhos, novas tradições ganham lugar. Num tempo de maior prosperidade, e maiores tentações em bens materiais, somos levados a questionar se queremos concentrar nos presentes o ponto alto do Natal. Com o cansaço de combinações e listas de comidas, damos connosco a duvidar se estamos a fazer a caminhada com a contemplação certa.
Creio que cada família deve escolher e honrar aquilo em que acredita. Na nossa, caminhar para o Natal implica escolher com antecedência as coisas com que nos vamos desgastar e aquelas de que não vamos abdicar. Implica criar rotinas e princípios que respeitem aquilo em que acreditamos mas também respeitem aqueles que nos são queridos e com quem vamos conviver. Portanto, lembramos o nascimento de Jesus todo o mês de Dezembro lendo a Bíblia e cantando, e isso inclui a mesa da noite de Natal. Também trocamos algumas lembranças de amor com os que amamos. Vemos filmes, jogamos e estamos juntos, e isso muitas vezes inclui pessoas que não são da nossa família e que estão sozinhas. Há sempre lugar para mais um (ou vários) na mesa. Concentramos os nossos esforços e alegria para acordar na manhã de dia 25 e louvar em comunidade. Ah, como eu amo esse dia de Natal!
Não sei como será o meu Natal de 2020. Não faço ideia de quais as medidas que o Governo tomará para este tempo e de que forma os convívios alargados poderão ser impedidos. Mas não é aí que reside a minha alegria, e quero convidar-te a não viveres com desapontamento aquilo que este Natal te pode trazer. Tenho a convicção que tempos diferentes são maravilhosas oportunidades de questionar.
Assim sendo, quero trazer-te várias questões para reflectires e considerares neste final de 2020, na era COVID-19:
■ Nunca fizeste um devocional diário com contagem decrescente, meditando no porquê de Jesus ter vindo, ao longo do mês de Dezembro? Talvez possas começar este ano.
■ Nunca te questionaste acerca da obrigatoriedade de dar presentes a todo o mundo? Talvez seja hora de pensares na gestão dos teus recursos e no propósito que eles devem ter.
■ Nunca tiraste tempo para cantar e louvar a Deus junto com a tua família na noite de 24? Pensa em como cantar e colocar Jesus na tua mesa pode ser feito.
■ Tens a possibilidade de congregar dia 25 mas nunca o fizeste porque ficar a preparar comida é mais importante? Talvez seja hora de reconsiderares o privilégio de louvar neste dia em especial e reestruturares os horários na tua casa.
Em 2020, o mundo continua a ser mundo porque Deus é Deus. Podemos ter pandemia, podemos ter guerras, podemos ter perseguições. Mas Deus continua no controlo de tudo. Não sabemos o propósito de tantas coisas parecerem erradas, de vermos tantos a sofrer, e de a nossa normalidade estar afectada. Mas sabemos que Deus é soberano e nada acontece sem estar previsto.
Por isso, aproveita estes novos tempos para questionar e abrandar. Para derramares o teu coração a Deus e a viveres com a alegria devida o bebé que encarnou há 2000 anos. Nesse dia, não havia lugar na hospedaria, não havia agitação nem grandes preparativos, e privilegiados foram os que testemunharam deste momento. Foi graças a este nascimento que o plano de redenção traçado por Deus se cumpriu. O bebé nascido do ventre de Maria seria o nosso Salvador, e é por isso que comemoramos o Natal! Vamos lembrar esta história única e reconsiderar esta época?
*Nota – “Roupa velha” é um prato típico em Portugal, confeccionado com as sobras do bacalhau feito na noite da Consoada (véspera do Natal).