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Restaurar para auxiliar

Há umas semanas participei num encontro de mães onde fomos desafiadas a parar e reflectir acerca da nossa história. Que momentos tiveram mais impacto nas nossas vidas? De que forma isso nos influenciou a nós e aos que estão à nossa volta? Dei por mim a pensar em vários momentos diferentes, e acabei por partilhar um que creio me trouxe até ao dia de hoje com um propósito e objectivo mais definido. Partilho hoje convosco também na esperança que possa servir de encorajamento e novos começos.

O nascimento do meu primeiro filho, foi aos olhos da generalidade das pessoas algo que correu muito bem, mãe e bebé estão bem e isso basta. Mas eu não me sentia assim. As intervenções constantemente “sugeridas” tornaram o meu trabalho de parto longe do que tinha idealizado, que seria o mais fisiológico possível. Senti que falhei na luta pelo que era melhor para mim e para o meu bebé vencida pelo grande cansaço acumulado e pela falta de apoio no respeito pelas minhas escolhas e pelo tempo que o meu corpo demorasse a parir. Durante muito tempo não me perdoava e sentia que me tinha atraiçoado. Se eu estava bem informada sobre a fisiologia de um parto natural e sobre as intervenções necessárias ou não, como é que não tinha conseguido seguir até ao fim com o meu plano? O ambiente e as circunstâncias mudaram as minhas decisões e no fim eu sentia-me defraudada sobre a alegria imensa que devia ter sentido quando recebi o meu bebé nos braços.

Deus rodeou-me de pessoas amorosas que me ajudaram a ultrapassar a mágoa que sentia. Uma querida amiga disse-me: “podes enfiar a cabeça na areia e fingir que nada aconteceu, podes culpabilizar-te e achares que tens “defeito” ou podes chorar, sim, mas olhar em frente. Situações más podem acontecer a todos mas o que fazemos com isso e como seguimos em frente é o que nos distingue. E Deus restaura, usa a oração.” Foi o que fiz. Durante vários meses orei para que Deus restaurasse o meu coração, me ajudasse a perdoar a mim própria e me desse a tranquilidade que necessitava para viver bem com o passado e avançar nesta nova etapa da maternidade. O meu coração foi-se tornando mais leve em relação a este assunto, não que tenha deixado de sentir uma certa tristeza quando penso na experiência que tive e na que poderia ter tido. Mas gradualmente Deus restaurou-me e o impacto da minha experiência negativa transformou-me também na forma como passei a apoiar grávidas e mães tanto a nível pessoal como profissional.

Todo este processo de nascimento teve também impacto na amamentação do meu filho. Uma má postura, má pega, perda de peso mais acentuada e novamente a pressão para desistir e introduzir leite artificial. E mais uma vez, Deus cuidou de nós e colocou pessoas no nosso caminho que foram uma benção tremenda. Apoio em consulta de lactação, apoio em consulta de osteopatia e gradualmente as dificuldades foram sendo superadas dando frutos por largos meses. Como enfermeira percebi o quanto tinha a aprender acerca desta arte da amamentação. Percebi como o meu conhecimento estava aquém das situações que me apareciam e para as quais muitas vezes não tinha resposta. Aqui ficou plantada uma semente. Fui melhorando os aconselhamentos às mães, aplicando o que tinha aprendido e vivido na minha própria experiência de maternidade. Esta semente foi germinando, cresceu e floresceu com a chegada da minha segunda filha. Tive novamente apoio na amamentação e com ele um desafio. O acolhimento e a reflexão que surgiram nesse encontro desafiaram-me a iniciar um percurso de formação na área da amamentação. Após vários meses de estudo e dedicação esta etapa culminou com a certificação em consultoria de lactação.

Creio que a restauração que Deus trouxe à minha vida após uma experiência traumática foi além daquilo que eu conseguia ver no momento. Orientou os meus passos e foi abrindo portas para trilhar este caminho em que posso ser útil no apoio de mães, bebés e famílias a cumprirem o seu desejo, ou não, de amamentar. Permitiu-me ter uma maior capacidade e mais conhecimentos nesta área em termos técnicos e científicos mas também aumentar o meu respeito, empatia e dedicação pelas mulheres com dificuldades na maternidade. A nossa visão é muitas vezes curta mas quando permitimos que Deus trabalhe nos nossos corações podemos ver como as suas bênçãos se estendem para além das nossas vidas, abençoando outros que precisam de amor, colo e amparo.

Escrito por -

Rita Magalhães tem 36 anos, é casada com o Rui há 8 anos e é mãe do Filipe (4 anos) e da Elisa (16 meses). Serve na Igreja da Lapa em Lisboa, Portugal. É enfermeira em cuidados de saúde primários há 13 anos, dedicou-se recentemente ao apoio de famílias na área da amamentação como Consultora de Lactação.

1 Comentário

  • Júnia Barbosa

    Que lindo Rita!! A tua partilha é preciosa e será muito relevante e inspiradora para muitas mães!

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